CARTA À VIDA – Renata Rothstein

Rio de Janeiro, 20 de março de 2021

À Vida

Amiga tão presente, e tão distante:

Desejo-te, só, grito inofensivo que se perde

Luzes inexpressivas em líquidos céus

A fria caminhada e um último pedido

Em vão. Mãos unidas acolhem, resignadas

A brevidade que há, nunca antes (pres)sentida

A ceifa, incessante, e a mágoa vivida jaz, esquecida

Já não faz diferença, muitas passagens são só de ida

São os tempos, em toda a parte, os templos gélidos

E um único desejo se esvai, torna rubra a terra

Desespera e o que não se encerra desavia eixos

Púrpura. Meus pulsos cortados contam histórias

(verídicas, e talvez ninguém queira, ou mereça ouvir)

Espelhos quebrados, meus eus, (des)fragmentados

Alma débil estéril murmúrios egos becos e ecos

E não há o que temer? Belo tempo, desaprender

Júris alienados salteiam os gemidos absolvidos

E é só um sussurro e eu juro, não compactuo

Enlace o superficial degrede o intransigente

Incompetente torpe nó, polui e (já) é só pó

Lento e soturno cumpre sua miserável sina

As esquinas os hiatos separados os trapos

E os trajetos incertos supostos deméritos

Semblantes fechados, tácitas faces coradas

Mas hoje é nunca, fachadas e encerramentos

Ninguém sai de tua via, sem quitar a conta

Eu abri a janela sorrindo – mas tudo que vi

Foi lamento

Vida

Apenas

Um momento.

Amiga. Hoje permito-me ficar, ainda um pouco mais, por aqui.

À espera talvez de um reencontro, em que não toquemos nas perguntas sem respostas, nas conclusões, indefinidas. Nas dúvidas, indevidas. Deixemos, então, que nada faça sentido, eco, ou rima.

Aguardo por ti na forma que vieres e sigo, (quase) serena, minha sina.

Sempre saudosa de ti,

Marlene Peixoto

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